quarta-feira, 17 de novembro de 2010

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Se Narciso se encontra com Narciso

e um deles finge
que ao outro admira

(para sentir-se admirado),
o outro
pela mesma razão finge também
e ambos acreditam na mentira.


Para Narciso
o olhar do outro, a voz
do outro, o corpo
é sempre o espelho
em que ele a própria imagem mira.
E se o outro é
como ele
outro Narciso,
é espelho contra espelho:
o olhar que mira
reflete o que o admira
num jogo multiplicado em que a mentira
de Narciso a Narciso
inventa o paraíso.
E se amam mentindo
no fingimento que é necessidade
e assim
mais verdadeiro que a verdade.

(Ferreira Gullar)

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